sábado, 5 de julho de 2008

Aquele cabelo era estranho, mas até gostava era completamente diferente de todos que viria na rua, mas eu gostava e não tinha vergonha, a minha cor preferida era usada na minha roupa, adorava ser assim.
Um dia fui há papelaria do senhor António e ele perguntou-me porque é que eu era assim, eu fiz uma cara estranha e perguntei:
- Assim como?
Ele como quem não queira coisa voltou a perguntar:
- Assim, diferente dos teus irmãos.
Eu olhei para ele e senti, que deveria ser sincero e dizer o que me atormentava há anos:
- Porque eu não sou irmão deles. -Fiz uma cara triste e saí da papelaria. tinha encenado muito bem, aquele momento único, mas... A população começou a falar sobre aquilo, sobre eu não ser irmão dos meus irmãos.
A minha mãe perguntou-me o porquê de ter inventado aquele disparate e eu, sem qualquer palavra, fui para o quarto e pintei a (minha) parede da cabeceira com aminha cor preferida, o vermelho, vermelho sangue, "vermelho dor", fiquei feliz.
Eu era feliz com as "barbaridades" que dizia, com as "barbaridades" que cometia, mas, mas como existe sempre um mas, eu era diferente, um ser diferente dos meus irmãos. Eu não gostava de ser igual a eles, eu não era igual a eles.
Éramos quatro, todos nós tinhamos uma parede com cores diferentes, eu, como sempre, usava o Vermelho, vermelho da dor, da minha felicidade; o Pedro o amarelo, tinha uma enorme sensação que este meu irmão era homossexual, não tinha nada com isso, "opção dele"; a Vanda adorava o Azul, adorava ir à praia e nadar no mar, ouvia "reggea" e fumava "charros", a decisão de morrer precocemente é dela, nada contra; e por fim o Luís, apesar de ser o mais velho, parecia o mais novo, admito que o mais bonito dos quatro, mas deveras o mais parvo, a cor da parede dele era o Verde.
Não falei da Teresa a que está no perfeito ventre da minha mãe, na ecografia é tão maravilhosa, adoro ver a cassete centenas de vezes, e sempre mais.
Referi quatro mas afinal somos cinto, e dizem que sou diferente, e sou, sou até agora o único "normal", gosto de ser diferente mas queria que os meus irmãos fossem ditos "normais", queria ter podido brincar com o Luís, com o Pedro e com a Vanda num passado longínquo, mas "não deu", todos eles tinham as suas vidas.
Quando nasci, o Luís estava no 9º ano e só pensava nas namoradas, isto dito por ele; a Vanda, como sempre, fumava charros e faltava às aulas para ir para a praia, não passou do 7º ano, o Pedro, o Pedro não sei, penso que deixou a escola quando andava no 6º ano, quando quis ir viver com um homem de 26 anos, homossexual, a minha mãe deixou, era opção dele, erro o dele hoje está arrependido.
A minha mãe é a heroína criou-nos sozinha, o meu pai vinha-nos visitar e engravidava-a e ia embora, a última vez geraram a Teresinha, ela diz, a minha mãe, que não quer mais, mas ela vai voltar a gerar uma criança nela, porque sei que ela sente-se viva tendo uma vida dentro dela, sente que não se pode matar, estaria a matar um filho.
Eu não posso ficar grávido, logo o meu sofrimento pode morrer a qualquer instante.
Só tenho uma opção...
Ser feliz no paraíso, neste momento estou à beira do passeio, a ver os carros a passar, quero derramar o sangue da minha felicidade, quero derramar o sangue da minha dor, neste momento só vejo carros vermelhos, são bonitos, tenho sangue vrmelho a escorrer pela boca, tenho o Azul do céu, o Amarelo no sol e o Verde daquela árvore quase morta, não, eu sim estou morto, mas feliz.
No paraíso tenho os meus irmãos...

1 comentário:

CátiaSofia disse...

Texto lindo, mesmo muito lindo!
Dis me so uma coisa este texto e real??
esta mesmo muito lindo
BjZzzzz